terça-feira, 3 de agosto de 2010

CONCEITO DE ETNIA

O conteúdo da raça é morfo-biológico e o da etnia é sócio-cultural, histórico
e psicológico. Um conjunto populacional dito raça “branca”, “negra” e “amarela”, pode
conter em seu seio diversas etnias. Uma etnia é um conjunto de indivíduos que, histórica ou
mitologicamente, têm um ancestral comum; têm uma língua em comum, uma mesma
religião ou cosmovisão; uma mesma cultura e moram geograficamente num mesmo
território.
Algumas etnias constituíram sozinhas nações. Assim o caso de várias sociedades
indígenas brasileiras, africanas, asiáticas, australianas, etc.. que são ou foram etnias nações.
Os territórios geográficos da quase totalidade das etnias nações africanas foram desfeitos e
redistribuídos entre territórios coloniais durante a conferência de Berlim (1884-1885). É por
isso que o mapa geo-político da África atual difere totalmente do mapa geo-político précolonial.
Os antigos territórios étnicos, no sentido dos estados nações são hoje divididos
entre diversos países africanos herdados da colonização. O antigo território da etnia iorubá
se encontra dividido hoje entre as Repúblicas de Nigéria, Togo e Benin; o antigo território
da etnia Kongo é hoje dividido entre as Repúblicas de Angola, Congo Kinshasa e Congo
Brazaville, etc. para citar apenas dois exemplos entre dezenas.
A maioria dos pesquisadores brasileiros que atuam na área das relações raciais e
interétnicas recorrem com mais freqüências ao conceito de raça. Eles empregam ainda este
conceito, não mais para afirmar sua realidade biológica, mas sim para explicar o racismo,
na medida em que este fenômeno continua a se basear em crença na existência das raças
hierarquizadas, raças fictícias ainda resistentes nas representações mentais e no imaginário
coletivo de todos os povos e sociedades contemporâneas. Alguns, fogem do conceito de
raça e o substituem pelo conceito de etnia considerado como um lexical mais cômodo que
o de raça, em termos de “fala politicamente correta”. Essa substituição não muda nada à
realidade do racismo, pois não destruí a relação hierarquizada entre culturas diferentes que
é um dos componentes do racismo. Ou seja, o racismo hoje praticado nas sociedades
contemporâneas não precisa mais do conceito de raça ou da variante biológica, ele se
reformula com base nos conceitos de etnia, diferença cultural ou identidade cultural, mas as
vítimas de hoje são as mesma de ontem e as raças de ontem são as etnias de hoje. O que
mudou na realidade são os termos ou conceitos, mas o esquema ideológico que subentende
a dominação e a exclusão ficou intato. É por isso que os conceitos de etnia, de identidade
étnica ou cultural são de uso agradável para todos: racistas e anti-racistas. Constituem uma
bandeira carregada para todos, embora cada um a manipule e a direcione de acordo com
seus interesses.
Em meus trabalhos, utilizo geralmente no lugar dos conceitos de “raça negra” e
“raça branca”, os conceitos de “Negros” e “Brancos” no sentido político-ideológico acima
explicado, ou os conceitos de “População Negra” e “População Branca”, emprestados do
biólogo e geneticista Jean Hiernaux, que entende por população um conjunto de indivíduos
que participam de um mesmo círculo de união ou de casamento e que, ipso facto,
conservam em comum alguns traços do patrimônio genético hereditário.
Tanto o conceito de raça quanto o de etnia são hoje ideologicamente manipulados. É
esse duplo uso que cria confusão na mente dos jovens pesquisadores ou iniciantes. A
confusão está justamente no uso não claramente definido dos conceitos de raça e etnia que
se refletem bem nas expressões tais como as de “identidade racial negra”, “identidade
étnica negra”, “identidade étnico-racial negra”, etc.
Os povos que aqui se encontraram e construíram um país que podemos
historicamente considerar como um encontro ou “carrefour” de culturas e civilizações, não
podem mais, em nome da Ciência biológica atual ou da Genética humana, ser considerados
como raças, mas sim como populações, na medida em que eles continuam pelas regras
culturais de endogamia, a participarem dos mesmos círculos de união ou casamento,
embora esses círculos não estivessem totalmente fechados como ilustrado pelo crescimento
da população mestiça. Por outro lado, todos esses povos foram oriundos de diversas etnias
da Europa, da África, da Ásia, da Arábia, etc. Aqui encontraram outros mosaicos indígenas
formados por milhões de indivíduos que foram dizimados pelo contato com a civilização
ocidental e cujos sobreviventes formam as chamadas tribos indígenas de hoje.
Podemos, no plano empírico, afirmar que todas essas diversidades oriundas da
Europa, da África, da Ásia, do Oriente Médio, etc. se aculturaram para formar novas etnias
“branca”, “negra”, e “amarela”, etc.? Não seria criar uma tremenda confusão na medida em
que o uso de tais conceitos remeteria a uma certa biologização da cultura? O que
significaria então uma etnia negra, branca ou amarela que por sua vez corresponde a uma
unidade cultural branca, negra e amarela? Os chamados negros, brancos e amarelos
estariam como as laranjeiras, mangueiras, bananeiras, etc. que produzem respectivamente
laranjas, mangas e bananas produzindo também as culturas brancas, negras e amarelas?
Sem dúvida, a etnia não é ume entidade estática. Ela tem uma história, isto é uma origem e
uma evolução no tempo e no espaço. Se olharmos atentamente a história de todos os povos,
perceberemos que as etnias nascem e desaparecem na noite dos tempos. Visto deste ângulo,
não seria errado falar de novas etnias ou etnias contemporâneas à condição que os que
usam esses conceitos tomem o cuidado de defini-los primeiramente para evitar confusões
com outros conceitos, etc. Não é isso que geralmente acontece com os usos dos conceitos
de cultura “negra” e “branca” ou de etnia “negra”. Os idealizadores desses conceitos
poderiam, no mínimo, definir os novos componentes e conteúdos desses conceitos no
contexto da dinâmica contemporânea das relações raciais e interétnicas.
Sem dúvida, por uma visão político-ideológica que colocou coletivamente os
brancos no topo da pirâmide social, do comando e do poder, independentemente de suas
raízes culturais de origem étnica, tem-se tendência, por vício da ideologia racista que
estabelece uma relação intrínseca entre biologia e cultura ou raça e cultura, a considerar a
população branca, independentemente de suas diferentes origens geográficos e culturais,
como pertencente a uma mesma cultura ou mesma etnia, daí as expressões equívocas e
equivocadas de “cultura branca” e “etnia branca”. Pelo mesmo raciocínio baseado na visão
político-ideológica que colocou coletivamente os negros na base da pirâmide como grupo
Têm-se culturas particulares que escapam da cultura globalizada e se posicionam até
como resistência ao processo de globalização. Essas culturas particulares se constróem
diversamente tanto no conjunto da população negra como no da população branca e
oriental. É a partir da tomada de consciência dessas culturas de resistência que se
constroem as identidades culturais enquanto processos e jamais produtos acabados. São
essas identidades plurais que evocam as calorosas discussões sobre a identidade nacional e
a introdução do multiculturalismo numa educação-cidadã, etc. Olhando a distribuição
geográfica do Brasil e sua realidade etnográfica, percebe-se que não existe uma única
cultura branca e uma única cultura negra e que regionalmente podemos distinguir diversas
culturas no Brasil. Neste sentido, os afro-baianos produzem no campo da religiosidade, da
música, da culinária, da dança, das artes plásticas, etc. uma cultura diferente dos afromineiros,
dos afro-maranhenses e dos negros cariocas. As comunidades quilombolas ou
remanescentes dos quilombos, apesar de terem alguns problemas comuns, apresentam
também histórias, culturas e religiões diferentes. Os descendentes de italianos em todo o
Brasil preservaram alguns hábitos alimentares que os aproximam da terra mãe; os gaúchos
no Rio Grande do Sul têm também peculiaridades culturais na sua dança, em seu traje e em
seus hábitos alimentares e culinários que os diferenciam dos baianos, etc. Como a
identidade cultural se construí com base na tomada de consciência das diferenças provindo
das particularidades históricas, culturais, religiosas, sociais, regionais, etc. se delineiam
assim no Brasil diversos processos de identidade cultural, revelando um certo pluralismo
tanto entre negros, quanto entre brancos e entre amarelos, todos tomados como sujeitos
históricos e culturais e não como sujeitos biológicos ou raciais.
“identidade étnico-racial negra”. A questão é saber se todos têm consciência do
conteúdo político dessas expressões e evitam cair no biologismo, pensando que os negros
produzem cultura e identidade negras como as laranjeiras produzem laranjas e as
mangueiras as mangas. Esta identidade política é uma identidade unificadora em busca de
propostas transformadoras da realidade do negro no Brasil. Ela se opõe a uma outra
identidade unificadora proposta pela ideologia dominante, ou seja, a identidade mestiça,
que além de buscar a unidade nacional visa também a legitimação da chamada democracia
racial brasileira e a conservação do status quo.

Um comentário:

  1. naum gostei mto do blog ..... foi mal ser tão sincera + é assiim q os BLOGUEIROS aprendem neah verdade ? Com as criticas + tambem com os elogios quem sabe outro dia naum volto aki e mudo de opinião se o blog estiver cm alguma coisa mudada ? Xau ah.. meu nome é Jessyca.

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