sábado, 17 de julho de 2010

A PASSAGEM DA COSMOLOGIA À ANTROPOLOGIA NO PENSAMENTO GREGO.


(extraído de: ABRÃO, Bernadette Siqueira. História da Filosofia. São Paulo: Nova Cultural, p. 36 a 38)

A partir dos sofistas e de Sócrates, muda o eixo da preocupação do pensamento grego, que passa do universo físico (cosmos) à realidade humana (antropológica). Trata-se da passagem da fase cosmológica para a fase antropológica.

Cosmologia: Estudo da totalidade absoluta das coisas existentes no universo.

Antropologia: Exposição sistemática dos conhecimentos que se tem a respeito do homem, ou estudo do homem.

Sofistas: (século V a. C)

* Relativização da verdade enquanto construção humana.

* “O homem é a medida de todas as coisas”. (Protágoras)

* Desenvolvimento da arte retórica.

* Professores pagos para ensinar a retórica aos filhos das novas classes enriquecidas com o comércio para que eles participem da democracia.

* Portanto, os sofistas não admitem uma verdade absoluta. A verdade muda de acordo com a sociedade e com a época.

* Principais representantes: Protágoras e Górgias.

OS SOFISTAS E RELATIVIZAÇÃO DA VERDADE

A vitória de Atenas sobre os persas, em (479 a.C). marca também a consolidação da democracia na cidade. Dentre os novos valores que surgem está o da educa­ção. Trata-se de formar cidadãos aptos à vida pública, e para isso deles se exige que sejam bons oradores, que saibam argumentar em público. Dessa educação encarregam-se os sofistas.

Os sofistas (literalmente, "sábios") são todos estrangeiros. Excluídos assim da condição de cidadãos, não se interessam diretamente pelos destinos da cidade.

Assim, não se preocupam com o que uma argumenta­ção pode ter de justo ou injusto, moral ou imoral, isso é assunto dos cidadãos. Basta lhes que seus discí­pulos aprendam a falar, não importa o quê, mas falar bem, de modo convincente, e que os remunerem pelo ensino. Dizia-se até que um aluno, para se consi­derar apto, devia convencer o mestre a não receber o pagamento; se não conseguisse convencê-lo, a lição fora mal ministrada e não mereceria remuneração. Se o conseguisse, não haveria por que pagar.

Mas os sofistas não são meros mercenários da arte de bem falar. Se não se preocupam com o conteúdo de um argumento é porque compartilham com os atenien­ses a experiência da democracia, em que o mundo humano aparece como uma criação do próprio homem. Nesse mundo não há um único princípio que a tudo comande, mas apenas convenções que os homens esta­belecem para depois abandonar. Os valores e as verda­des são instáveis e relativos. A própria linguagem, essa capacidade essencialmente humana, também não passa de convenção, sem poderes para expressar a verdade, a não ser verdades relativas de cada um.

Essas idéias abalam a filosofia, que iria considerar os sofistas seus inimigos, sem, contudo conseguir igno­rá-los. As críticas chegaram a tal ponto que eles nem sequer eram considerados filósofos. A palavra "sofista" ganhou o sentido de "demagogo", e "sofisma" de "ar­gumento falso".

Na Grécia clássica, odiados, eles pro­curavam acumular conhecimentos e técnicas sobre as mais diversas atividades humanas. De todas elas, po­rém, detêm-se mais na linguagem. Consideram que na democracia, na qual as diferenças sociais e econômicas não contam, a linguagem é a única força que têm os homens. Por isso é necessário conhecê-la ao máximo, da gramática às figuras.

A filosofia passa assim a se afastar das investiga­ções dos pré-socráticos, sobre a natureza e o universo, para ocupar-se mais e mais das questões propriamente humanas.

O homem é a medida de todas as coisas”...

... "das que são enquanto são, e das que não são enquanto não são." A afirmação de Protágoras (485­-410 a.C.), considerado o primeiro sofista, significa que o mundo é aquilo que o homem faz e desfaz por intermédio dos sentidos. E, caso haja um princípio único, o ser humano não pode conhecê-lo.

Essa concepção, que separa a ordem das coisas naturais e a dos homens, abre a possibilidade da for­mulação de idéias não só sobre o conhecimento como também sobre a política e a moral. Uma vez que a medida de todas as coisas é o homem, seu conheci­mento está limitado pelos sentidos, que mudam de um para outro (o que é doce para alguns, por exem­plo, pode ser amargo para os demais). Assim, se existe algum acordo entre os homens, não resulta do conhecimento de uma suposta verdade absoluta, mas de simples convenção.

De maneira semelhante, os modos de organização social e política não derivam de um único princípio de justiça e sim das convenções criadas pelos homens de acordo com as circunstâncias e as conveniências. No âmbito da moral dá-se o mesmo. Bem e mal são simplesmente valores que o ser humano convencionou cha­mar por esses nomes.

Ao denunciar as certezas, ao duvidar da existência de uma única verdade, os sofistas acabaram por atrair também a ira dos cidadãos comuns. Diz-se que Protá­goras teria sido condenado pela pólis. Não era para menos. Se na obra “A Verdade” ele a questiona, em “Sobre os Deuses” afirma a impossibilidade de decidir sobre a existência dos seres divinos.

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